A Filha do Rei de Elfland | Primeiros Capítulos
Primeiros Capítulos

A Filha do Rei de Elfland | Primeiros Capítulos

I

O plano do Parlamento de Erl

Em seus casacos rubicundos de couro que chegavam aos joelhos, os homens de Erl apareceram diante de seu soberano, o homem majestoso de cabelos brancos em seu comprido salão vermelho. Ele se apoiou em sua cadeira esculpida e ouviu o porta-voz.

E assim o porta-voz disse:

— Durante setecentos anos, os chefes da sua raça nos governaram bem; e seus feitos são lembrados pelos menestréis modestos que ainda vivem de suas pequenas canções tilintantes. Mas as gerações passam, e não há nada de novo.

— O que vocês fariam? — indagou o soberano.

— Seríamos governados por um soberano mágico — responderam eles.

— Que assim seja — disse o soberano. — Faz quinhentos anos que meu povo fala disso no parlamento, e sempre deve ser como o parlamento diz. Vocês se pronunciaram. Que assim seja.

E ele ergueu a mão e abençoou a todos, e eles saíram.

Voltaram para as artes arcaicas: calçar os cascos dos cavalos com ferro, trabalhar o couro, cuidar das flores, administrar as necessidades árduas da Terra; eles seguiam os modos antigos e procuravam uma coisa nova. Mas o velho soberano enviou uma mensagem para seu primogênito, pedindo que fosse até ele.

E em pouco tempo o jovem estava diante do pai, naquela mesma cadeira esculpida da qual não tinha se levantado, onde a luz, entardecendo pelas janelas altas, mostrava os olhos envelhecidos contemplando o futuro além do tempo daquele velho soberano. E sentado ali ele deu a seguinte ordem ao filho:

— Vá — disse ele —, antes que meus dias acabem, portanto vá depressa, e siga daqui em direção ao leste e passe pelos campos que conhecemos, até ver as terras que pertencem claramente às fadas; atravesse a fronteira, que é feita de crepúsculo, e vá àquele palácio que só pode ser mencionado em canções.

— É longe daqui — disse o jovem Alveric.

— Sim — respondeu ele —, é longe.

— E mais longe ainda — disse o jovem — para voltar. Pois as distâncias naqueles campos não são como aqui.

— Mesmo assim — disse o pai.

— O que quer que eu faça — disse o filho — quando chegar a esse palácio?

E o pai respondeu:

— Que você se case com a filha do Rei de Elfland.

O jovem pensou na beleza dela e na coroa de gelo, e na doçura que as runas fabulosas diziam que lhe pertencia. Canções sobre ela eram entoadas nas colinas selvagens onde cresciam minúsculos morangos, ao fim da tarde e no despontar das estrelas, e, se alguém procurasse o cantor, não encontraria ninguém ali. Em algumas ocasiões, apenas o nome dela era entoado suave e repetidamente. Seu nome era Lirazel.

Era uma princesa de linhagem mágica. Os deuses tinham enviado suas sombras para seu batizado, e as fadas também teriam comparecido, mas ficaram com medo de ver em seus campos orvalhados as esguias sombras animadas dos deuses, por isso ficaram escondidas em touceiras de anêmonas em um tom rosa-claro e assim abençoaram Lirazel.

— Meu povo exige um soberano mágico para governá-los. Fizeram uma escolha tola — disse o velho soberano —, e só os Sombrios que não mostram seu rosto sabem o que isso vai provocar, mas nós, que não vemos, seguimos o costume antigo e fazemos o que nosso povo diz no parlamento. Talvez algum espírito de sabedoria que eles não conhecem possa salvá-los mesmo assim. Vá, então, com seu rosto voltado para aquela luz que pulsa da terra das fadas e que ilumina de um jeito fraco o entardecer entre o pôr do sol e as primeiras estrelas, e ela deve guiá-lo até você chegar à fronteira além dos campos que conhecemos.

Ele soltou uma correia e um cinturão de couro e ofereceu sua enorme espada para o filho, dizendo:

— Isto, que conduziu nossa família por todas as eras até este dia, certamente o protegerá ao longo da jornada, mesmo que você esteja muito além dos campos que conhecemos.

E o jovem a pegou, mesmo sabendo que nenhuma espada poderia beneficiá-lo.

Perto do Castelo de Erl morava uma bruxa solitária, nas terras altas perto dos trovões, que sobejavam nas colinas durante o verão. Lá ela morava sozinha em uma cabana estreita de palha e perambulava pelos campos altos sozinha para recolher os raios. Desses raios, que não tinham sido forjados na terra, eram feitas, com runas adequadas, armas para combater perigos sobrenaturais.

E sozinha essa bruxa perambulava em certas marés da primavera, assumindo a forma de uma jovem em sua beleza, cantando por entre as flores altas nos jardins de Erl. Ela saía na hora em que mariposas esfingídeas começavam a voar de campânula em campânula. E entre os poucos que a tinham visto estava esse filho do Soberano de Erl. E, embora fosse uma calamidade amá-la, embora isso arrebatasse os pensamentos dos homens para longe de tudo que era real, a beleza da forma que não era dela o atraíra para encará-la com olhos jovens e até mesmo profundos – se ela agia por orgulho ou por piedade, quem poderia saber, sendo mortal? –, ela poupou aquele que suas artes poderiam muito bem ter destruído e, transformando-se instantaneamente naquele jardim ali, mostrou a ele a forma legítima de uma bruxa letal. E mesmo assim os olhos dele não a abandonaram de imediato e, nos momentos em que esse olhar se demorou sobre aquela forma enrugada que assombrava as malvas, ele obteve a gratidão dela, que não poderia ser comprada nem conquistada por nenhum amuleto conhecido pelos cristãos. E ela o chamara, e ele a seguira e soubera, por ela, em sua colina assombrada pelo trovão, que, no dia da necessidade, uma espada poderia ser feita de metais não nascidos na Terra, com runas ao longo da lâmina que certamente afastariam qualquer golpe de espada terrena, e apenas três runas principais poderiam frustrar as armas de Elfland.

Enquanto pegava a espada do pai, o jovem pensou na bruxa.

Mal tinha escurecido no vale quando deixou o Castelo de Erl e subiu a colina da bruxa tão rápido que uma luz fraca ainda perdurava nas partes altas da mata quando ele se aproximou da cabana. Encontrou aquela que procurava queimando ossos em uma fogueira a céu aberto. Ele disse a ela que o dia da necessidade havia chegado. E ela o fez colher raios no jardim, na terra macia sob os repolhos.

E ali, com olhos que viam cada minuto mais escuro e dedos que se acostumavam com as superfícies curiosas dos raios, ele encontrou dezessete antes que a escuridão o cobrisse; e os empilhou em um lenço de seda e os levou para a bruxa.

Na grama ao lado dela, ele pousou esses desconhecidos da Terra. De espaços maravilhosos eles vinham para o jardim mágico dela, atirados pelo trovão sobre caminhos em que não podemos pisar; e, apesar de eles mesmos não conterem magia, eram bem adaptados para carregar a magia que as runas lhes proporcionariam. Ela deixou de lado o osso da coxa de um materialista e se voltou para os viajantes tempestuosos. Ela os arrumou em uma fileira única ao lado da fogueira. E sobre eles colocou a lenha em chamas e as brasas, espicaçando-as com o cetro de ébano que é o cajado das bruxas, até ter coberto profundamente os dezessete primos da Terra que nos visitaram vindos de seu lar etéreo. Ela se afastou da fogueira e estendeu as mãos e, de repente, a explodiu com uma runa apavorante. As chamas se ergueram, assombradas. E o que era apenas uma fogueira solitária na noite, sem nenhum mistério além do que pertence a todas essas fogueiras, refulgiu em algo que os viajantes temiam.

Enquanto as chamas verdes, atormentadas pelas runas, se erguiam, e o calor do fogo ficava mais intenso, ela deu mais passos para trás e simplesmente enunciou as runas um pouco mais alto quanto mais se afastava da fogueira. Ela pediu que Alveric empilhasse lenhas escuras de carvalho que jaziam amontoadas na mata; e, de imediato, quando ele as soltou, o calor as lambeu; e a bruxa continuou enunciando suas runas cada vez mais alto, e as chamas dançavam selvagens e verdes; e sob as brasas os dezessete, cujos caminhos tinham cruzado a Terra quando vagavam livremente, conheceram um calor tão grandioso quanto o que tinham conhecido, mesmo naquela viagem desesperada que os levara até ali. E, quando Alveric não podia mais se aproximar do fogo e a bruxa estava a alguns metros de distância gritando suas runas, as chamas mágicas consumiram as cinzas, e aquela potência que refulgia na colina cessou de repente, deixando apenas um círculo que brilhava de modo sombrio no chão, como a poça maligna que reluz onde houve uma explosão de termite. E, deitada no halo, ainda totalmente líquida, estava a espada.

A bruxa se aproximou e aparou as bordas com uma espada que tirou da própria coxa. Em seguida ela se sentou ao lado dela no solo e cantou para a espada enquanto ela esfriava. Diferente das runas que enfureceram as chamas era a canção que ela entoava para a espada: ela, cujas maldições fizeram o fogo explodir até consumir toras de carvalho, agora entoava uma melodia que era como um vento no verão soprando de jardins de florestas selvagens que nenhum homem cultivou, descendo por vales antes adorados por crianças, agora perdidos para elas exceto em sonhos, uma canção de lembranças que espreitam e se escondem nas fronteiras do esquecimento, agora brotando de belos anos de vislumbre de um momento dourado, agora fugindo rapidamente da memória de novo para voltar às sombras do esquecimento e deixando na mente aqueles traços mínimos de minúsculos pés reluzentes que, quando são obscuramente percebidos por nós, são chamados de remorso. Ela cantava sobre antigas tardes de verão na época das campânulas: cantava naquela charneca alta e sombria uma música que parecia tão cheia de manhãs e tardes preservadas com todos os seus orvalhos pela sua arte mágica em dias que já teriam se perdido, que Alveric se perguntou com cada asinha errante que o fogo dela tinha atraído do crepúsculo se esse era o espírito de alguma época perdida para os homens, invocado pela força de sua canção de tempos mais belos. E, enquanto isso, o metal sobrenatural endurecia. O líquido branco enrijeceu e ficou vermelho. O brilho do vermelho esmoreceu. E, conforme esfriava, também se estreitou: pequenas partículas se uniram, pequenas fendas se fecharam: e, enquanto elas se fechavam, se apossavam do ar ao redor e, com o ar, capturaram a runa da bruxa e a prenderam para sempre. E assim ela se transformou em uma espada mágica. E praticamente toda a magia das florestas inglesas, desde o florescer das anêmonas até a queda das folhas, estava na espada. E praticamente toda a magia das terras baixas ao sul, por onde perambulam apenas ovelhas e pastores silenciosos, a espada detinha. E havia nela o aroma de tomilho e o aspecto dos lilases, e o coro de pássaros que cantam antes do amanhecer em abril, e o profundo esplendor dos rododendros e a flexibilidade e a jovialidade dos riachos, e quilômetros e quilômetros de flores de maio. E, quando a espada ficou preta, estava totalmente encantada de magia.

Ninguém pode lhe dizer tudo que há para ser dito sobre essa espada; pois aqueles que conhecem os caminhos do Espaço no qual seus metais costumavam flutuar, até a Terra capturá-los um por um enquanto navegavam em sua órbita, têm pouco tempo para desperdiçar em coisas como a magia, e assim não podem lhe dizer como a espada foi feita, e aqueles que sabem onde se encontram a poesia e a necessidade que os homens têm de canções ou conhecem todos os cinquenta ramos da magia têm pouco tempo para desperdiçar em coisas como ciência e, portanto, não podem lhe dizer de onde vieram os ingredientes. Basta saber que ela já esteve além da nossa Terra e aqui entre as nossas pedras mundanas; que já foi apenas como essas pedras, e agora tem em si algo parecido com o que a música suave tem; quem puder que as defina.

E agora a bruxa pegou a lâmina preta pelo punho, que era grosso e arredondado em um dos lados, pois ela havia feito um pequeno sulco no solo sob o punho com esse propósito, e começou a afiar os dois lados da espada esfregando-os com uma pedra esverdeada curiosa, ainda entoando sobre ela uma canção misteriosa.

Alveric a observava em silêncio, pensando, sem contar o tempo; podem ter sido instantes, pode ter sido enquanto as estrelas viajaram grandes distâncias em seu curso. De repente, ela terminou. Levantou-se com a espada apoiada nas duas mãos. Estendeu-a para Alveric de um jeito seco; ele a pegou, ela desviou o olhar; e havia uma expressão nos olhos dela como se quisesse manter a espada ou manter Alveric. Ele se virou para agradecer, mas ela havia sumido.

Ele bateu à porta da casa sombria; chamou “Bruxa, Bruxa” pela extensão da mata solitária, até as crianças de fazendas distantes ouvirem e ficarem apavoradas. Então, voltou para casa, e foi o melhor para ele.

 

II

Alveric avista as Montanhas Élficas

No aposento comprido com poucos móveis, alto na torre, no qual Alveric dormia, um raio direto do sol nascente entrou. Ele acordou e se lembrou imediatamente da espada mágica, e isso deixou seu despertar mais feliz. É natural se sentir alegre ao pensar em um presente recente, mas também havia uma alegria na espada em si, que talvez se comunicasse com os pensamentos de Alveric com mais facilidade por terem acabado de sair do mundo dos sonhos, que era preeminentemente o reino da própria espada; mas, de qualquer modo, todos aqueles que se aproximaram de uma espada mágica sempre sentiram essa alegria de maneira clara e inequívoca enquanto ela ainda era nova.

Ele não tinha despedidas para fazer, mas achou melhor obedecer imediatamente à ordem do pai do que ficar para explicar por que estava levando em sua aventura uma espada que achava melhor do que a que seu pai adorava. Por isso, nem ficou para comer, mas colocou comida em uma sacola e pendurou em uma alça uma garrafa de bom couro novo, sem esperar para enchê-la, pois sabia que encontraria riachos; e, carregando a espada do pai do jeito que as espadas são carregadas normalmente, pendurou a outra nas costas com o punho bruto amarrado perto do ombro e saiu a passos largos do Castelo e do Vale de Erl. Dinheiro ele levou pouco, meio punhado de cobre apenas, para usar nos campos que conhecemos, já que não sabia que moeda ou meio de troca era usado no outro lado da fronteira do crepúsculo.

Bem, o Vale de Erl fica muito perto da fronteira além da qual não há nada dos campos que conhecemos. Ele subiu a colina e andou a passos largos pelos campos e passou pelos bosques de avelãs; e o céu azul brilhava alegremente sobre ele conforme seguia pelos campos, e o azul também era vibrante a seus pés quando ele chegou à floresta, pois era época das campânulas. Comeu, encheu a garrafa de água e viajou o dia todo em direção ao leste, e ao entardecer as montanhas das fadas surgiram no seu campo de visão, da cor de pálidas miosótis.

Quando o sol se pôs atrás de Alveric, ele olhou para as montanhas azul-claras para ver com qual cor seus picos surpreenderiam o fim da tarde; mas elas nunca exibiam nem um tom do sol poente, cujo esplendor dourava todos os campos que conhecemos, nunca uma dobra desbotava em seus precipícios, nunca uma sombra se aprofundava, e Alveric descobriu que nada do que acontece aqui repercute nas terras encantadas.

Ele desviou os olhos dessa beleza pálida e serena e os voltou para os campos que conhecemos. E ali, com suas cumeeiras se erguendo para a luz do sol sobre sebes profundas embelezadas pela primavera, ele viu cabanas de homens terrenos. Passou por elas enquanto a beleza do fim da tarde aumentava, com as canções dos pássaros e os aromas escapando das flores e odores que se aprofundavam cada vez mais, e o entardecer se enfeitava para receber a Estrela Vespertina. Mas, antes que essa estrela aparecesse, o jovem aventureiro encontrou a cabana que procurava; pois, tremulando sobre a porta, ele viu a placa da enorme pele marrom com letras raras em dourado que proclamavam que o habitante ali embaixo era um correeiro.

Um velho apareceu na porta quando Alveric bateu, pequeno e encurvado com a idade, e se inclinou ainda mais quando Alveric declarou seu nome. O jovem pediu uma bainha para sua espada, mas não disse que espada era. E ambos entraram na cabana, onde a velha esposa estava, ao lado da grande lareira, e o casal fez as honras a Alveric. O velho então se sentou perto da mesa sólida, cuja superfície brilhava de tão lisa nos pontos onde não estava esburacada por pequenas ferramentas que perfuraram os cortes de couro ao longo de toda a vida daquele homem e na época de seus ancestrais. E ali ele pousou a espada sobre os joelhos e se admirou com a brutalidade do punho e do guarda-mão, pois eram feitos de metal rudimentar não trabalhado, e com a enorme largura da espada; em seguida, estreitou os olhos e começou a pensar no seu negócio. E em pouco tempo pensou no que deveria ser feito; e sua esposa lhe trouxe uma bela pele; e ele marcou nela dois cortes da largura da espada e um pouco mais largos que ela.

E qualquer pergunta que ele fazia sobre aquela espada brilhante e larga Alveric conseguia desviar, pois não queria causar per­plexidade em sua mente contando tudo que ela era. Ele causou perplexidade suficiente no velho casal um pouco depois, quando pediu para se hospedar ali naquela noite. E isso permitiram-lhe com todos os pedidos de desculpas, como se eles é que tivessem pedido um favor, e lhe deram uma excelente ceia servida do seu caldeirão, no qual fervilhava tudo que o velho tinha caçado; mas nada que Alveric pudesse dizer os impediu de lhe dar a própria cama e preparar uma pilha de peles para eles passarem a noite ao lado da lareira.

E, depois da ceia, o velho cortou os dois pedaços largos de couro com uma ponta no fim de cada um e começou a costurá-los juntos nos dois lados. Alveric começou a lhe perguntar sobre o caminho, e o velho correeiro falou do norte e do sul e do oeste e até do noroeste, mas sobre o leste e o sudeste não disse uma palavra. Ele morava bem perto da fronteira dos campos que conhecemos, mas, sobre qualquer indício de alguma coisa além deles, nem ele nem a esposa falaram nada. No local por onde a jornada de Alveric continuava no dia seguinte, eles pareciam pensar que o mundo acabava.

E, ponderando depois na cama que eles lhe deram sobre tudo que o velho dissera, Alveric às vezes se admirava com sua ignorância, mas às vezes se perguntava se podia ser por habilidade que os dois tivessem evitado durante todo o entardecer qualquer palavra sobre alguma coisa que existisse a leste ou sudeste de seu lar. Ele ficou pensando se, na juventude, o velho poderia ter ido até lá, mas não conseguiu nem pensar no que ele teria encontrado se tivesse ido. Então Alveric adormeceu, e os sonhos lhe deram indícios e palpites sobre as peregrinações do velho na Terra das Fadas, mas não deram guias melhores do que ele já tinha, que eram os picos azul-claros das Montanhas Élficas.

O velho o acordou depois que ele dormiu por muito tempo. Quando chegou à sala, um fogo radiante estava queimando, o café da manhã estava preparado para ele e a bainha estava pronta, cabendo com exatidão na espada. Os velhos esperavam em silêncio por ele e receberam o pagamento pela bainha, mas não aceitaram nada pela hospitalidade. Em silêncio eles o observaram partir e o seguiram sem palavras até a porta, e lá fora ainda o observavam, na clara esperança de que ele seguisse para o norte ou o oeste; mas, quando virou e seguiu a passos largos em direção às Montanhas Élficas, eles não o observaram mais, pois seus rostos nunca se viravam naquela direção. E, apesar de não o observarem mais, ele acenou um adeus; pois tinha um sentimento pelas cabanas e pelos campos desse povo simples, apesar de eles não sentirem isso pelas terras encantadas. Ele caminhou na manhã cintilante por cenários familiares desde a infância; viu as orquídeas rubicundas florescendo cedo, lembrando às campânulas que elas tinham acabado de passar do seu vigor; as jovens folhinhas do carvalho ainda estavam amarelo-amarronzadas; as novas folhas de faia reluziam como latão, onde o cuco cantava mais cedo; e uma bétula parecia uma criatura dos bosques selvagens que se enrolara em gaze verde; em arbustos formosos havia brotos de flores de maio. Alveric se despediu várias vezes de todas essas coisas: o cuco continuou cantando, e não era para ele. E então, quando ele atravessou uma sebe e chegou a um campo sem cuidados, ali adiante, bem perto estava, como seu pai lhe dissera, a fronteira do crepúsculo. Ela se estendia na sua frente, azul e densa como água; e as coisas que se viam através dela pareciam disformes e brilhantes. Ele olhou para trás, para os campos que conhecemos; o cuco continuava cantando sem preocupação; um pequeno pássaro cantava sobre seus assuntos particulares; e, como nada parecia responder nem dar importância à sua despedida, Alveric seguiu a passos largos cheio de coragem em direção àquelas imensas parcelas de crepúsculo.

Um homem em um campo não muito distante estava chamando os cavalos, havia pessoas conversando em um caminho nos arredores enquanto Alveric adentrava o baluarte do crepúsculo; imediatamente esses sons ficaram fracos, zumbindo tênues, como se estivessem muito distantes: em poucos passos ele atravessou, e nem um murmúrio veio dos campos que conhecemos. Os campos de onde ele viera terminaram subitamente; não havia resquício de suas sebes verdejantes; ele olhou para trás e a fronteira parecia estar abaixando, enevoada e esfumaçada; olhou ao redor e não viu nada conhecido; no lugar da beleza de maio estavam as maravilhas e os esplendores de Elfland.

As montanhas azul-claras se assomavam imponentes em sua glória, reluzindo e ondulando em uma luz dourada que parecia emanar de maneira ritmada dos picos e inundava todas aquelas encostas com brisas de ouro. E, abaixo delas, ainda distantes, ele viu se erguerem para o ar, totalmente prateados, os pináculos do palácio que só pode ser mencionado em canções. Ele estava em uma planície na qual as flores eram raras e a forma das árvores era monstruosa. Partiu imediatamente em direção aos pináculos prateados.

Para aqueles que sabiamente mantiveram suas ilusões dentro dos limites dos campos que conhecemos, é difícil eu falar da terra à qual Alveric tinha chegado, de modo que em suas mentes eles consigam ver a planície com árvores espalhadas e bem distantes da floresta sombria da qual o palácio de Elfland erguia aqueles pináculos reluzentes, e sobre eles e além deles aquela cadeia de montanhas cujos cumes não recebiam nenhuma cor das luzes que vemos. E é exatamente por esse motivo que nossas ilusões viajam para longe e, se meu leitor, por falha minha, não conseguir visualizar os picos de Elfland, minha ilusão deveria ter ficado nos campos que conhecemos. Saiba, então, que em Elfland as cores são mais intensas que nos nossos campos, e o próprio ar de lá brilha com uma luminescência tão profunda que todas as coisas vistas ali têm algo da aparência das nossas árvores e flores em junho refletidas na água. E as cores de Elfland, que me desesperei para explicar, ainda podem ser definidas, pois temos indícios delas aqui; o azul intenso da noite no verão assim que o ocaso se foi, o azul-claro de Vênus inundando o entardecer de luz, as profundezas dos lagos no crepúsculo; tudo isso são indícios dessas cores. E, embora nossos girassóis se virem cuidadosamente para o sol, algum antepassado dos rododendros deve ter se virado um pouco na direção de Elfland, de modo que um pouco dessa glória persiste neles até hoje. E, acima de tudo, nossos pintores tiveram muitos vislumbres daquele reino, de modo que às vezes em quadros vemos uma magia maravilhosa demais para os nossos campos; é uma memória deles que se infiltrou de algum vislumbre antigo das montanhas azul-claras enquanto eles se sentavam diante de cavaletes pintando os campos que conhecemos.

E assim Alveric caminhou a passos largos pelo ar luminoso daquela terra cujos vislumbres vagamente lembrados são inspirações aqui. E de repente se sentiu menos solitário. Pois há uma barreira nos campos que conhecemos, delimitando bruscamente os homens e todas as outras formas de vida, de modo que, se passarmos um dia distante da nossa espécie, nos sentimos solitários; mas, ao atravessar a fronteira do crepúsculo, Alveric percebeu que essa barreira tinha desaparecido. Corvos andando pela charneca olhavam de um jeito estranho para ele, todos os tipos de pequenas criaturas espiavam curiosas para ver quem tinha chegado de um canto de onde tão poucos vinham; para ver quem saiu em uma jornada da qual tão poucos retornavam; pois o Rei de Elfland guardava bem sua filha, como Alveric sabia, embora não soubesse como. Havia um brilho alegre de interesse em todos aqueles pequenos olhos, e uma expressão que poderia significar advertência.

Talvez houvesse menos mistério aqui do que no nosso lado da fronteira do crepúsculo; pois nada espreitava nem parecia espreitar por trás dos grandes troncos de carvalho, como, em certas luzes e estações, as coisas espreitavam nos campos que conhecemos; nenhuma estranheza se escondia na margem distante das montanhas; o que poderia espreitar estava claramente ali para ser visto, qualquer estranheza que pudesse existir estava bem à vista do viajante, o que pudesse assombrar as florestas profundas vivia ali no dia claro.

E o encantamento era tão forte e profundo sobre toda aquela terra que não apenas os animais e os homens adivinhavam bem as intenções uns dos outros, mas parecia haver até mesmo um entendimento que se estendia dos homens até as árvores e das árvores até os homens. Pinheiros solitários pelos quais Alveric às vezes passava na charneca, com os troncos sempre incandescendo de luz rubicunda que absorveram por magia de um antigo pôr do sol, pareciam assomar sobre ele como alguém de mãos na cintura se inclinando de leve para encará-lo. Era quase como se elas não tivessem sido sempre árvores, antes de o encantamento tê-las alcançado ali; parecia que iam lhe dizer alguma coisa.

Mas Alveric não deu nenhuma atenção aos alertas dos animais e das árvores e seguiu a passos largos em direção à floresta encantada.

 

 

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