O Coelhinho de Veludo | Conto Original | Margery Williams | 1922
Neste clássico infantil, tudo o que o coelho de veludo quer é se tornar real. Será que o amor do menino será suficiente para ele se tornar um coelhinho de carne e osso?
Era uma vez um coelho de veludo, e no início ele era mesmo muito esplêndido. Gorducho e atarracado, como todos os coelhos devem ser; sua pelagem era repleta de bolinhas marrons e brancas, ele tinha bigodes de linha de verdade, e suas orelhas tinham contornos de cetineta rosa. Na manhã de Natal, quando enfiado na meia do menino, com um raminho de azevinho entre as patas, o efeito era encantador.
Havia outras coisas na meia — nozes e laranjas e um motor de brinquedo, amêndoas cobertas com chocolate e um rato mecânico —, mas o coelho era o melhor de todos. Por pelo menos duas horas, o menino o amou, e então tias e tios vieram para jantar, e houve um grande farfalhar de papel de seda e pacotes desembrulhados e, na animação de ver todos os novos presentes, o coelho de veludo foi esquecido.
Por muito tempo, ele habitou o armário de brinquedos ou o chão do quarto do bebê, e ninguém pensava muito nele. O coelho era naturalmente tímido, e, sendo feito apenas de veludo, alguns dos brinquedos mais caros o esnobavam. Os brinquedos mecânicos eram muito superiores e andavam de nariz em pé; estavam cheios de ideias modernas e fingiam que eram de verdade. O modelo de barco, que sobrevivera a duas estações e perdera a maior parte de sua pintura, não perdia a oportunidade de se referir ao seu cordame em termos técnicos. O coelho não podia dizer se era modelo de qualquer coisa, pois não sabia que existiam coelhos de verdade; achava que todos eram preenchidos de serragem como ele, e reconhecia que a serragem estava bastante fora de moda e nunca deveria ser mencionada nos círculos modernos. Até Timothy, o leão de madeira articulado, que fora construído por soldados com deficiência e deveria ter uma visão mais ampla das coisas, era cheio de si e fingia estar ligado ao governo. Entre todos eles, o pobre coelhinho se sentia muito insignificante e banal, e a única pessoa que era gentil com ele era o cavalo em miniatura.
O cavalo vivera mais tempo no quarto do que qualquer um dos outros brinquedos. Ele era tão velho que sua pelagem marrom tinha remendos e mostrava as costuras por baixo, e a maioria dos pelos em sua cauda tinham sido puxados para fazer colares de contas. Ele era sábio, pois tinha visto uma longa sucessão de brinquedos mecânicos chegarem se gabando, e aos poucos quebrarem suas molas principais e morrerem, e sabia que não passavam de brinquedos e nunca se transformariam em outra coisa. A magia do quarto de uma criança é muito estranha e maravilhosa, e apenas brinquedos velhos, sábios e experientes como o cavalo entendem do assunto.
— O que é ser de verdade? — perguntou o coelho um dia, quando estavam deitados lado a lado perto do cercadinho do bebê, antes que a babá viesse arrumar o quarto. — Significa ter coisas que vibram dentro de você e uma manivela?
— Ser de verdade não se trata de como você é feito — respondeu o cavalo. — É uma coisa que acontece. Quando uma criança te ama por muito, muito tempo, não só para brincar, mas te ama pra valer, então você se torna de verdade.
— Dói? — perguntou o coelho.
— Às vezes — disse o cavalo, pois sempre dizia a verdade. — Quando se é de verdade, você não se importa em se machucar.
— Acontece de uma vez, como quando se dá corda, ou pouco a pouco?
— Não acontece tudo de uma vez. Você se torna. Leva muito tempo. É por isso que não costuma acontecer com brinquedos que quebram com facilidade, ou que têm extremidades pontudas, ou que precisam ser guardados com cuidado. Em geral, quando se é de verdade, grande parte de seu cabelo foi tão amado que caiu, e seus olhos são estufados e você tem articulações frouxas e muito puídas. Mas essas coisas não importam, porque, quando se é de verdade, você não pode ser feio, exceto para pessoas que não entendem.
— Suponho que você seja de verdade — disse o coelho. E então desejou não ter dito, pois o cavalo podia ser sensível.
Mas ele apenas sorriu.
— O tio do menino me tornou de verdade — disse ele. — Foi há muitos anos; mas, uma vez que acontece, é para sempre.
O coelho suspirou. Pensou que levaria um bom tempo antes que essa magia acontecesse com ele. Ele ansiava por ser de verdade, para saber como era; e, ainda assim, a ideia de ficar puído e perder os olhos e os bigodes era bastante triste. Desejou poder se tornar de verdade sem que essas coisas desagradáveis acontecessem.
Havia uma pessoa chamada babá que governava o quarto do bebê. Às vezes, ela não reparava nos brinquedos espalhados, e em outras, sem nenhum motivo aparente, passava como uma ventania e guardava-os nos armários. Chamava isso de “arrumação”, e os brinquedos odiavam, principalmente os de lata. O coelho não se importava muito, pois, por mais que fosse jogado, pousava suavemente.
Uma noite, quando o menino estava indo para a cama, não conseguiu encontrar o cachorro de porcelana com o qual sempre dormia. A babá estava com pressa, e era muito trabalhoso procurar cachorros de porcelana na hora de dormir, então ela apenas olhou ao redor e, vendo que a porta do armário de brinquedos estava aberta, pegou qualquer coisa.
— Aqui — disse ela —, pegue seu velho coelho! Ele serve para dormir com você! — E arrastou o coelho por uma orelha, colocando-o nos braços do menino.
Naquela noite, e por muitas noites depois, o coelho de veludo dormiu na cama do menino. A princípio, ele achou bastante desconfortável, pois o menino o abraçava com muita força, e às vezes rolava sobre ele, e em outras o empurrava tanto para debaixo do travesseiro que o coelho mal conseguia respirar. Além disso, ele também sentia falta daquelas longas horas sob o luar no quarto, quando toda a casa estava em silêncio, e das conversas com o cavalo. Mas logo o coelho começou a gostar, pois o menino costumava conversar com ele e lhe fazia belos túneis sob as roupas de cama, que dizia serem como as tocas em que os coelhos de verdade viviam. Tinham brincadeiras esplêndidas juntos, aos sussurros, quando a babá ia jantar e deixava a vela acesa na cornija da lareira. E, quando o menino adormecia, o coelho se aconchegava sob seu queixo quente e sonhava, com as mãos do menino apertadas em volta dele a noite toda.
Assim, o tempo passou, e o coelhinho ficou muito feliz — tão feliz que nunca percebeu como seu lindo pelo de veludo estava ficando cada vez mais esfarrapado, e sua cauda se desfazendo, e todo o rosa desbotando de seu nariz onde o menino o beijava.
A primavera chegou, e eles tiveram longos dias no jardim, pois, onde quer que o menino fosse, o coelho ia junto. Ele passeava no carrinho de mão, tinha piqueniques na grama e lindas cabanas de fadas construídas para ele sob os galhos da framboeseira que ficava atrás das flores. Uma vez, quando o menino foi chamado de repente para ir tomar chá, o coelho ficou no gramado até muito depois do anoitecer, e a babá teve que ir buscá-lo com a vela porque o menino não conseguia dormir sem ele. O coelho estava todo molhado de orvalho e meio sujo de terra por ter se enfiado nas tocas que o menino havia feito para ele no canteiro de flores, e a babá resmungou enquanto o esfregava com a ponta do avental.
— Tome esse seu coelho velho! — exclamou ela. — Olhe toda essa bagunça por causa de um brinquedo!
O menino se sentou na cama e estendeu as mãos.
— Me dê meu coelho! — disse ele. — Você não deve dizer isso. Ele não é um brinquedo. Ele é de verdade!
O coelhinho ficou feliz de ouvir isso, pois sabia que o que o cavalo dissera enfim era verdade. A magia do quarto de bebê acontecera com ele, e o coelho não era mais um brinquedo. Ele era de verdade. O próprio menino dissera.
Naquela noite, estava quase feliz demais para dormir, e tanto amor preenchia seu coraçãozinho de serragem que este estava prestes a explodir. E, em seus olhos de botão, que havia muito tempo perderam o brilho, apareceu um olhar de sabedoria e beleza que até a babá notou pela manhã ao apanhá-lo.
— Ora, se esse coelho velho não parece sábio? — disse ela.
Foi um verão incrível!
Perto da casa onde moravam havia um bosque, e nas longas noites de junho o menino gostava de ir até lá depois do chá para brincar. Ele levava o coelho de veludo consigo e, antes de sair para colher flores ou brincar em meio às árvores, sempre fazia para o amigo um ninhozinho em algum lugar entre as samambaias, onde ficaria bem aconchegado, pois tinha um bom coração e gostava que o coelho ficasse confortável. Uma noite, enquanto o coelho estava deitado ali sozinho, observando as formigas que corriam de um lado para o outro na grama entre suas patas de veludo, viu dois seres estranhos saírem da samambaia alta ali perto.
Eram coelhos como ele, mas bem peludos e novinhos em folha. Deviam ser muito bem-feitos, pois suas costuras não apareciam, e mudavam de forma de uma maneira estranha quando se moviam; num minuto, eram compridos e magros e, no seguinte, gorduchos e atarracados, em vez de permanecerem sempre os mesmos, como ele. Os pés tocavam o chão com suavidade, e eles chegaram bem perto, mexendo o nariz, enquanto o coelho olhava fixamente para ver de que lado o mecanismo se projetava, pois sabia que os brinquedos que pulam costumam ter algo para dar corda. Mas não viu nada. Era evidente que eram um novo tipo de coelho.
Os coelhos o encararam, e o coelhinho encarou de volta. E o tempo todo seus narizes se mexiam.
— Por que não se levanta e brinca conosco? — perguntou um deles.
— Não tenho vontade — disse o coelho, pois não queria explicar que não tinha um mecanismo.
— Ah! É muito fácil — garantiu o coelho peludo.
E deu um grande salto de lado e pousou sobre as pernas traseiras.
— Acho que você não consegue! — provocou ele.
— Consigo sim! — retrucou o coelhinho. — Posso saltar mais alto do que qualquer coisa!
Ele estava falando de quando o menino o atirava, mas claro que não queria contar isso.
— Consegue saltar com as pernas traseiras? — perguntou o coelho peludo.
Era uma pergunta terrível, pois o coelho de veludo não tinha pernas traseiras! A parte de trás dele fora feita toda em uma única peça, como uma alfineteira. Ele estava paradinho na samambaia, e torcia para que os outros coelhos não percebessem.
— Não quero — repetiu ele.
Mas os coelhos selvagens tinham olhos muito afiados. E um deles esticou o pescoço e olhou.
— Ele não tem pernas traseiras! — exclamou ele. — Imagine um coelho sem pernas traseiras! — E começou a rir.
— Tenho sim! — gritou o coelhinho. — Tenho pernas traseiras! Estou sentado nelas!
— Então as estique e me mostre, assim — disse o coelho selvagem.
E começou a girar e dançar, até que o coelhinho ficou bem tonto.
— Não gosto de dançar — retrucou ele. — Prefiro ficar parado!
Mas todo aquele tempo ele quisera dançar, pois uma nova sensação de cócegas tomou conta dele, e o coelhinho sentiu que daria tudo para ser capaz de pular por aí como aqueles coelhos faziam.
O coelho estranho parou de dançar e se aproximou bastante. Dessa vez, chegou tão perto que seus longos bigodes fizeram cócegas na orelha do coelho de veludo, e então ele torceu o nariz de repente, abaixou as orelhas e deu um pulo para trás.
— O cheiro dele é estranho! — exclamou o outro. — Ele não é um coelho! Não é de verdade!
— Eu sou de verdade! — disse o coelho. — Sou de verdade! O menino disse que sim!
E quase começou a chorar.
Justo nesse momento veio o barulho de passos, e o menino passou correndo por eles; e, com passos pesados e um vislumbre de caudas brancas, os dois coelhos estranhos desapareceram.
— Voltem e brinquem comigo! — chamou o coelhinho. — Ah, voltem! Eu sei que sou de verdade!
Mas não houve resposta, apenas as formiguinhas passando de lá para cá, e a samambaia balançando suavemente onde os dois estranhos passaram. O coelho de veludo estava sozinho.
Oh, céus, pensou ele. Por que eles fugiram assim? Por que não podiam parar e falar comigo?
Por um bom tempo, ele ficou bem parado, observando a samambaia e esperando que voltassem. Mas eles nunca retornaram, e logo o sol se pôs e as mariposas brancas bateram asas. O menino veio e levou-o para casa.
Semanas se passaram, e o coelhinho ficou muito velho e esfarrapado, mas o menino o amava tanto quanto antes. Ele o amava tanto que puxou todos os seus bigodes, o forro rosa de suas orelhas ficou cinza, e suas bolinhas marrons desbotaram. Ele até começou a perder a forma, e já não parecia mais um coelho, exceto para o menino. Para ele, o coelho era sempre bonito, e isso era tudo o que importava para o coelhinho. Ele não se preocupava com sua aparência para as outras pessoas, porque a magia do quarto do bebê o tornara real, e quando se é real, estar esfarrapado não importa.
E então, um dia, o menino ficou doente.
Seu rosto ficou muito corado, ele falava dormindo, e seu corpinho estava tão quente que queimava o coelho ao abraçá-lo. Pessoas estranhas iam e vinham no quarto, e uma luz ardia a noite toda. Durante todo esse tempo, o coelhinho de veludo ficou ali, escondido sob as roupas de cama, e nunca se mexeu, pois temia que se o encontrassem poderiam levá-lo embora, e sabia que o menino precisava dele.
Foi um período longo e cansativo, pois o menino estava doente demais para brincar, e o coelhinho achava tudo muito monótono, sem nada para fazer o dia todo. Mas ele se aconchegou pacientemente, ansiando pelo momento em que o menino melhorasse e eles saíssem para o jardim entre as flores e as borboletas e jogassem jogos esplêndidos entre as framboeseiras como costumavam fazer. Ele planejou todo tipo de coisas maravilhosas para fazerem e, enquanto o menino ficava deitado, meio dormindo, meio acordado, o coelho se aproximava do travesseiro e sussurrava todas aquelas maravilhas em seu ouvido. Logo a febre baixou, e o menino melhorou. Ele conseguia se sentar na cama e olhar para livros ilustrados, enquanto o coelhinho se aconchegava ao seu lado. E, um dia, eles o deixaram se levantar e se vestir.
Era uma manhã clara e ensolarada, e as janelas estavam escancaradas. Levaram o menino para a sacada, envolto em um xale, e o coelhinho ficou enroscado entre os lençóis, pensando.
O menino ia para a praia no dia seguinte. Tudo estava arranjado, e agora só restava cumprir as ordens do médico. Eles conversaram sobre tudo, enquanto o coelhinho estava deitado debaixo das cobertas, só com a cabeça espiando, ouvindo. O quarto deveria ser desinfetado, e todos os livros e brinquedos com que o menino brincava na cama deveriam ser queimados.
Oba, pensou o coelhinho. Amanhã iremos para a praia!
Pois o menino costumava falar da praia, e o coelho queria muito ver as grandes ondas, os caranguejinhos e os castelos de areia.
Foi então que a babá o viu.
— E quanto a este coelho velho? — perguntou ela.
— Isto? — replicou o médico. — Ora, é uma massa de germes de escarlatina! Queime agora. O quê? Besteira! Compre um novo. Ele não deve mais brincar com este!
E assim o coelhinho foi colocado em um saco com os livros velhos ilustrados e um monte de lixo, e levado para os fundos do jardim, atrás do galinheiro. Aquele era um bom lugar para fazer uma fogueira, só que o jardineiro estava muito ocupado naquele momento para cuidar dela. Ele tinha batatas para cavar e ervilhas para colher, mas, na manhã seguinte, prometeu vir bem cedo e queimar tudo.
Naquela noite, o menino dormiu em um quarto diferente e tinha um novo coelhinho para dormir com ele. Era um coelhinho esplêndido, todo de pelúcia branca com olhos de vidro de verdade, mas o menino estava animado demais para se importar muito com isso. Pois, pela manhã, ele iria para a praia, e aquilo em si era uma coisa tão maravilhosa que ele não conseguia pensar em mais nada.
E enquanto o menino dormia, sonhando com a praia, o coelhinho jazia entre os velhos livros ilustrados no canto atrás do galinheiro, sentindo-se muito solitário. O saco tinha sido deixado desamarrado, então, contorcendo-se um pouco, ele conseguiu enfiar a cabeça pela abertura e olhar para fora. Estava tremendo um pouco, pois sempre estivera acostumado a dormir em uma cama decente, e a essa altura sua pelagem estava tão fina e puída de tanto abraçar que não lhe fornecia mais nenhuma proteção. Perto dali, conseguia ver o emaranhado dos galhos da framboeseira, o mato crescendo alto e próximo como em uma floresta tropical, em cuja sombra ele brincara com o menino em manhãs passadas. Pensou naquelas longas horas de sol no jardim — como eram felizes — e uma grande tristeza o invadiu. Parecia vê-los passar diante de si, cada dia mais bonito que o outro, as cabanas de fadas no canteiro de flores, as tardes tranquilas na floresta quando se deitava nas samambaias e as formiguinhas que corriam sobre suas patas; o dia maravilhoso em que soube pela primeira vez que era real. Pensou no cavalo em miniatura, tão sábio e gentil, e em tudo o que ele lhe contara. De que adiantava ser amado, perder a beleza e se tornar de verdade se tudo acabasse assim? E uma lágrima, uma lágrima de verdade, escorreu por seu narizinho puído de veludo e caiu no chão.
E então aconteceu uma coisa estranha. Pois, onde a lágrima caiu, uma flor brotou do chão, uma flor misteriosa, nada parecida com qualquer outra que crescia no jardim. Tinha folhas delgadas e verdes, da cor de esmeraldas, e, no centro delas, uma flor tal qual uma taça de ouro. Era tão bela que o coelhinho se esqueceu de chorar e ficou ali, olhando. E logo a flor se abriu, e dela saiu uma fada.
Era a fada mais linda do mundo inteiro. Seu vestido era de pérolas e gotas de orvalho, e havia flores no pescoço e no cabelo, e seu rosto era como a flor mais perfeita de todas. Então ela se aproximou do coelhinho e o pegou nos braços, beijando-o bem no nariz de veludo que estava todo úmido de tanto chorar.
— Coelhinho — disse ela —, você não sabe quem sou eu?
O coelho olhou para ela, e pareceu-lhe que havia visto o rosto dela antes, mas não conseguia saber de onde.
— Sou a fada mágica do quarto do bebê — disse ela. — Tomo conta de todos os brinquedos que as crianças já amaram. Quando estão velhos e puídos e as crianças não precisam mais deles, eu venho, levo-os comigo e faço com que se tornem de verdade.
— Eu não era de verdade antes? — perguntou o coelhinho.
— Você era de verdade para o menino — disse a fada — porque ele o amava. Agora, você deve se tornar de verdade para todos.
E ela segurou o coelhinho com força e voou com ele para a floresta.
Estava claro, pois a lua se erguia no céu. Toda a floresta estava linda, e as frondes da samambaia brilhavam como prata congelada. Na clareira aberta entre os troncos das árvores, os coelhos selvagens dançavam com suas sombras na grama aveludada. Mas, ao ver a fada, todos pararam de dançar e formaram um círculo para fitá-la.
— Trouxe um novo companheiro para vocês — disse ela. — Vocês devem ser muito gentis com ele e ensiná-lo tudo o que precisa saber para viver na Coelândia, pois ele viverá com vocês para todo o sempre!
E a fada tornou a beijar o coelhinho e o pousou na grama.
— Corra e brinque, coelhinho! — disse ela.
Mas o coelhinho ficou parado e quieto por um instante, sem se mexer. Pois, quando viu todos os coelhos selvagens dançando ao seu redor, de repente lembrou-se de suas patas traseiras e não queria que vissem que não as tinha. O coelhinho, porém, não sabia que quando a fada o beijara da última vez, ela o transformara por completo. E poderia ter ficado sentado lá por muito tempo, tímido demais para se mexer, se naquele momento algo não tivesse feito cócegas em seu nariz, e antes que pensasse no que estava fazendo, levantou o dedo do pé traseiro para coçá-lo.
E descobriu que tinha mesmo patas traseiras! Em vez de uma pelagem de veludo encardido, tinha pelo marrom, macio e brilhante; suas orelhas se contraíam sozinhas e seus bigodes eram tão compridos que roçavam a grama. O coelhinho deu um salto e a alegria de usar aquelas patas foi tão grande que ele saiu pulando na grama sobre elas, saltando de lado e girando como os outros, e ficou tão animado que quando enfim parou para procurar a fada, ela havia partido.
Ele era enfim um coelho de verdade, em casa, com os outros coelhos.
O outono passou, bem como o inverno, e, na primavera, quando os dias ficaram quentes e ensolarados, o menino saiu para brincar no bosque atrás de casa. E, enquanto estava brincando, dois coelhos saíram da samambaia e o espiaram. Um deles era todo marrom, mas o outro tinha marcas estranhas sob o pelo, como se em um tempo remoto tivesse bolinhas, que ainda estavam visíveis. E em seu narizinho macio e seus olhos redondos e pretos havia algo familiar, de modo que o menino pensou consigo mesmo:
Ora, ele se parece com meu velho coelhinho que se perdeu quando tive escarlatina!
Mas ele nunca soube que era mesmo seu próprio coelhinho, que voltara para ver a criança que primeiro o ajudara a ser de verdade.
O Coelho de Veludo e diversos outros contos de Natal estão disponíveis em Contos dos Antigos Natais Escritos por Mulheres. Conheça a coletânea clicando aqui!