Já ouvi dizer que meninas não sabem guardar segredos. Isso é mentira: nós somos a prova. Guardamos o nosso por anos e anos, desde que viemos morar em Piscul Dracului e encontramos o caminho para o Outro Reino. Ninguém sabia — nem papai, nem Florica, nossa governanta, nem Petru, o marido dela, nem tio Nicolae e tia Bogdana ou o filho deles, Cezar. Encontramos o portal quando Tati tinha sete anos e eu, seis, e vínhamos indo e voltando por ele quase todos os meses desde então: nove anos de Luas Cheias. Tínhamos muitas maneiras de esconder nossa ausência, incluindo uma tranca em nosso quarto e a desculpa de que nossa irmã Paula às vezes tinha ataques de sonambulismo.
Na verdade, o segredo não era só nosso; Gogu também sabia. Mas mesmo que os sapos pudessem falar, Gogu jamais teria dito qualquer coisa. Assim que eu o encontrara sozinho na floresta, há muitos anos, confuso e machucado, soube que poderia confiar mais nele do que em qualquer pessoa no mundo.
Era Lua Cheia. No quarto, nossos vestidos e sapatos estavam preparados; bolsas e prendedores de cabelo haviam sido colocados ao lado deles. Nada seria tocado até que todos os outros habitantes da casa estivessem dormindo. Felizmente, era raro Florica subir até nosso quarto, pois ficava no topo de uma escadaria, e subir escadas fazia os joelhos dela doerem. Eu me perguntava o quanto Florica sabia, ou o quanto adivinhava. Ela deve ter percebido que sempre ficávamos muito quietas nas noites de Lua Cheia e que sempre estávamos cansadas quando descíamos para tomar café na manhã seguinte. Mas, se sabia de algo, jamais havia mencionado.
Durante o dia, fizemos o de sempre, tentando não levantar suspeitas. Paula ajudou Florica a cozinhar ciorba de peixe enquanto Iulia foi estocar sacos de grãos para o inverno com Petru. Iulia não gostava de fazer o trabalho duro da fazenda, mas, pelo menos assim, dizia ela, o tempo passava mais depressa. Tati estava ensinando Stela a ler: vi as duas enroscadas num canto quentinho da cozinha, desenhando letras na areia molhada.
Eu estava no escritório com papai, comparando uma série de pedidos com um registro de pagamentos. Era boa em matemática e sempre o ajudava nesse tipo de tarefa. Papai era mercador, sócio de seu primo, a quem chamávamos de tio Nicolae, e os dois trabalhavam muito. Gogu estava sentado na escrivaninha, perdido em seus próprios pensamentos, mas às vezes dizia algo com sua voz interior — aquela que só eu escutava.
Você está chateada, Jena.
— Hum — murmurei, sem querer iniciar uma conversa séria com ele enquanto papai e Gabriel, seu ajudante, estivessem ao meu lado. Minha família não acreditava que às vezes eu sabia o que Gogu estava pensando. Mesmo minhas irmãs, que há muito haviam aceitado o fato de que aquele sapo era diferente dos outros, achavam que eu estava me enganando, talvez colocando minhas próprias palavras na boca dele. Mas eu sabia que não era bem assim. Tinha Gogu desde pequena e as coisas que ele me dizia definitivamente não vinham da minha cabeça.
Não fique triste. Hoje é noite de Lua Cheia.
— Não posso evitar, Gogu. Estou preocupada. Agora fique quieto, ou papai vai me escutar.
Papai estava tentando escrever uma carta. Ele tossia sem parar e, entre um ataque de tosse e outro, lutava para recuperar o fôlego. Na manhã seguinte, viajaria para o porto de Constanta, local com o clima mais ameno da costa do Mar Negro. O médico lhe dissera que, se ousasse passar mais um inverno em Piscul Dracului, estaria morto antes que as primeiras flores surgissem nos carvalhos. Eu e minhas quatro irmãs iríamos tomar conta da casa sozinhas durante todo o inverno. É claro que tio Nicolae nos ajudaria com a parte comercial e Florica e Petru ajudariam com a casa e a fazenda. Não era a responsabilidade extra que me preocupava. Papai sempre viajava a trabalho e nós conseguíamos dar um jeito em tudo, embora as viagens jamais tivessem durado tanto tempo assim. O que me fazia sentir um frio na espinha era pensar que nossa despedida na manhã seguinte talvez fosse para sempre.
Permanecemos calados durante o jantar. Eu estava pensando sobre aquilo que papai confidenciara a mim e a Tati um pouco mais cedo. Até então, ninguém havia mencionado que ele poderia morrer, pois dizer isso em voz alta seria colocar o impensável em palavras. Mas papai queria que suas filhas mais velhas se preparassem para tudo. Explicara que, se falecesse antes que qualquer uma de nós se casasse e tivesse um filho, tanto Piscul Dracului quanto sua parte do negócio iriam para tio Nicolae, que era nosso parente homem mais próximo. Não devíamos nos preocupar, dissera papai. Se o pior acontecesse, tio Nicolae cuidaria de nós.
A casa de tio Nicolae se chamava Vârful: o Cume da Tempestade. Era uma casa imponente que ficava no topo de uma colina, cercada por uma floresta de pinheiros e vidoeiros. Ele tinha uma fazenda muito próspera e vendia madeira, além de possuir a empresa mercantil que o deixara rico. Nós vivíamos na cidade de Brasov quando éramos pequenas, e as visitas que fazíamos a Vârful eram sempre maravilhosas. É difícil dizer o que eu mais amava no lugar: a floresta, o lago proibido ou a alegria de brincar com nossos primos mais velhos.
Quanto ao que papai mais amava, não havia dúvidas: ao lado de Vârful ficava Piscul Dracului, o Pico do Demônio. Papai era criança quando vira pela primeira vez aquele castelo abandonado e depredado num contraforte da montanha. Ele era um homem estranho, e assim que batera os olhos em Piscul Dracului soube que queria viver ali. Ninguém tinha herdado o castelo ou o pedaço de floresta que fazia parte da propriedade; talvez as inúmeras histórias estranhas contadas sobre o lugar haviam assustado as pessoas. O dono morrera há muito tempo. Florica e Petru eram os guardiões de Piscul Dracului há anos, limpando os quartos vazios e conseguindo viver do que tiravam da fazenda, pois eram pessoas frugais e trabalhadoras.
Papai demorou bastante tempo para realizar seu sonho. Ele trabalhara muito, casara, tivera filhas, comprara e vendera, e economizara bastante. Quando juntara dinheiro suficiente das vendas de tapetes de seda e de pele de urso, especiarias e porcelanas finas, pagara uma enorme soma a um voivode influente, tornara-se sócio de tio Nicolae e nos levara para Piscul Dracului.
Acho que minha mãe teria preferido ficar em Brasov, pois tinha medo das histórias que o povo contava sobre o velho castelo. Ele parecia ter nascido da própria floresta, seus pedaços surgindo aqui e ali, por todos os cantos: torres grandes e rechonchudas, longas passarelas cobertas, arcos e mastros. O nobre excêntrico que o construíra provavelmente fora um homem como papai. As pessoas raramente se aventuravam a entrar na floresta que rodeava Piscul Dracului. Havia um lago em meio às árvores cujo apelido era Água Morta, embora seu nome verdadeiro fosse mais bonito: Taul Ielelor, Lago das Ninfas. Todas as famílias tinham uma história terrível para contar sobre o Água Morta. A nossa aconteceu logo depois de nos mudarmos para o castelo. Quando eu tinha cinco anos, meu primo Costi — o filho mais velho de tio Nicolae — se afogara em Taul Ielelor. Eu estava lá quando aconteceu. As coisas que o povo diz sobre o lago são verdadeiras.
Antes de papai ficar tão doente, Tati e eu nunca tínhamos pensado no que aconteceria a Piscul Dracului se não houvesse um filho homem para herdar a propriedade. Minha irmã mais velha era uma sonhadora e eu tinha um futuro diferente em mente: um futuro no qual eu trabalharia junto com papai, viajando, comercializando e vendo o mundo. Casamento e filhos eram secundários no meu plano de vida. Mas agora, com a tosse de papai em nossos ouvidos e seu rosto pálido nos encarando do outro lado da mesa, haviam se tornado uma realidade assustadora. Eu me lembrava de ouvir tia Bogdana dizer que dezesseis era a idade ideal para uma mulher se casar. Tati já completara dezesseis anos, e eu era só um ano mais nova.
Papai foi dormir assim que a refeição acabou; mal tocara na comida. Minhas irmãs correram para o quarto, mas eu esperei Florica apagar as brasas do fogão, Petru trancar a porta da frente e ambos irem se deitar. Ao ver que não havia mais perigo, subi a escada aos pulos, minhas preocupações esquecidas por enquanto, meu coração batendo forte com uma mistura de alegria e medo. Finalmente, era chegada a hora.
O longo quarto que nós cinco dividíamos tinha quatro janelas redondas de vidro pintado: uma lilás, outra vermelha, outra azul-escura e outra verde-clara. Lá fora, a Lua Cheia flutuava no céu escuro. Coloquei Gogu numa prateleira, e ele ficou me observando enquanto eu tirava o vestido do dia a dia e botava meu vestido verde de festa, pelo qual meu sapo tinha uma predileção especial. Paula estava acendendo as lamparinas, pois íamos precisar delas em nossa jornada.